A alimentação para a doença renal crônica (DRC) é fundamental no manejo e na qualidade de vida dos pacientes. Quando diagnosticado com DRC, é essencial adotar uma dieta equilibrada que ajude a reduzir a sobrecarga nos rins, controle os níveis de substâncias como potássio, fósforo e sódio, e previna complicações relacionadas a doenças de base, como diabetes e hipertensão.
Alimentação para a doença renal crônica (DRC)
Antes de entendermos como deve ser a alimentação para a doença renal crônica (DRC) é importante distinguirmos as diferentes condições relacionadas à função renal: a Insuficiência Renal Aguda (IRA), a Doença Renal Crônica (DRC) e a Insuficiência Renal Crônica (IRC).
- A Insuficiência Renal Aguda (IRA) é uma perda súbita da função renal, normalmente reversível, causada por fatores como infecções, medicamentos, ou desidratação extrema.
- A Doença Renal Crônica (DRC) é uma condição de perda progressiva e irreversível da função renal, cujas causas, geralmente, são doenças de base, como diabetes e hipertensão. Embora possa ser causada também por doenças autoimunes ou hereditárias, por exemplo.
- A Insuficiência Renal Crônica (IRC) é uma etapa avançada da DRC, em que a função renal está gravemente comprometida e, muitas vezes, requer tratamento como diálise constante ou transplante.
Pacientes com condições renais frequentemente têm doenças de base como diabetes e hipertensão, que exigem monitoramento contínuo e ajustes na dieta para evitar a progressão da doença renal. No caso do diabetes, o foco é controlar o índice glicêmico das refeições, enquanto para hipertensão, o foco está em moderar a ingestão de sódio – embora ambos sejam importantes em qualquer dieta saudável.
Basicamente, a alimentação para a doença renal crônica pode se dividir entre o tratamento conservador, e o tratamento em diálise, levando em conta as doenças de base. A distinção entre os dois tratamentos se baseia na capacidade dos rins e na função da diálise:
- Tratamento conservador: a alimentação busca minimizar a sobrecarga renal.
- Diálise: a alimentação busca repor perdas de nutrientes e controlar os minerais entre as sessões.
Em ambas as fases, as doenças de base precisam ser monitoradas de perto, pois controlá-las contribui diretamente para a preservação da saúde renal e geral do paciente.
As necessidades nutricionais de pacientes com DRC variam conforme o estágio da doença e o tipo de tratamento. Os macronutrientes e principais nutrientes-alvo na alimentação para a doença renal crônica, são:
- Frutas, legumes e verduras
Na alimentação para a doença renal crônica, é essencial controlar o consumo de potássio para evitar complicações como a hiperpotassemia. Muitas frutas, legumes e verduras são naturalmente ricos em potássio e podem ser incluídos com moderação, desde que preparados de forma a reduzir o teor de potássio. O método mais comum para isso é fervê-los e descartar a água de cozimento.
- Frutas ricas em potássio (com moderação e atenção na preparação): banana, abacate, mamão, melão, laranja, manga. As frutas geralmente não são fervidas, mas é importante limitar seu consumo ou escolher alternativas com menor teor de potássio.
- Frutas pobres em potássio: maçã, pêra, uva, cereja, morango, amora, framboesa, mirtilo, abacaxi, limão.
- Verduras e legumes ricos em potássio (indicam fervura e descarte da água): abóbora, cenoura, chuchu, espinafre, acelga, couve.
- Verduras e legumes pobres em potássio: pepino, abobrinha, pimentão, berinjela, cebola, alho, rabanete, palmito, nabo, alface crespa e americana, repolho verde, repolho roxo, rúcula, agrião, escarola.
- Técnica para reduzir o potássio: o processo para minimizar o teor de potássio é conhecido como “duplo cozimento” ou lixiviação”:
Corte o alimento em pedaços pequenos para aumentar a superfície de contato. Mergulhe em água fria por cerca de 2 horas antes de cozinhar (opcional, mas ajuda na remoção de potássio). Ferva em bastante água (sem tampa), o potássio se dissolve na água. Descarte completamente a água do cozimento.
Se necessário, repita o processo.
- Tamanho das porções: mesmo alimentos pobres em potássio podem se tornar fontes significativas do mineral se consumidos em grandes quantidades. Controle as porções conforme a recomendação médica ou nutricional.
- Variedade: opte por diversificar a alimentação, utilizando uma combinação de alimentos com baixo teor de potássio para manter a alimentação equilibrada.
- Cuidado com alimentos industrializados: alimentos enlatados ou processados podem conter potássio adicionado, mesmo que o alimento base seja naturalmente pobre. Verifique os rótulos.
- Carboidratos
Na alimentação para a doença renal crônica é importante escolher carboidratos integrais, de baixo a médio índice glicêmico, como aveia, arroz integral, milho, trigo em grãos, mandioca, inhame, entre outros. É importante fazer o duplo cozimento para reduzir o potássio dos tubérculos também.
- Tratamento conservador: os carboidratos devem estar em quantidades moderadas para evitar sobrecarga de glicose no sangue e é importante evitar farinhas e açúcares refinados. Em casos de diabetes, é especialmente importante equilibrar a ingestão de carboidratos para manter a glicemia controlada.
- Diálise: a alimentação para a doença renal crônica durante a diálise permite uma maior ingestão de carboidratos, devido à demanda energética aumentada pela diálise, mas ainda é importante priorizar fontes saudáveis e minimizar o consumo de farinhas e açúcares refinados.
- Proteínas
A ingestão de proteínas pode variar conforme o estágio e o tipo de tratamento da DRC:
- Tratamento conservador: a ingestão de proteínas deve ser controlada (0,6 a 0,8g/kg de peso) para evitar o acúmulo de resíduos nitrogenados, que podem sobrecarregar os rins. Opte por proteínas de alto valor biológico, como ovos (limitado a 1 unidade) e carnes magras (patinho, peito de frango, tilápia) e leguminosas mais baixas em potássio com moderação (grão-de-bico, feijão e lentilha).
- Diálise: durante a diálise, há uma maior perda de aminoácidos e outros nutrientes, exigindo uma ingestão proteica mais alta (1 a 1,3g/kg de peso) para compensar.
- Gorduras
Tanto no tratamento conservador, quanto na diálise, as gorduras são uma importante fonte de calorias, especialmente quando a ingestão de proteínas e carboidratos for mais limitada. Prefira gorduras mono e poli-insaturadas, presentes no azeite, que podem ajudar a controlar a inflamação. Castanhas devem ser consumidas com moderação, pois são ricas em potássio. Peixes gordos, chia e linhaça, que são fontes de gordura poli-insaturada ômega-3, são ricos em fósforo e devem ser evitados. Verifique com um nutricionista de sua confiança, a possibilidade de suplementar ômega 3, caso não tenha nenhuma contraindicação.
- Potássio
É um mineral muito presente nas frutas, legumes e verduras, como visto no tópico 1:
- Tratamento conservador: em muitos casos de DRC, os níveis de potássio precisam ser monitorados, pois a hiperpotassemia (excesso de potássio) pode levar a complicações cardíacas. Alimentos como batata, banana e tomate devem ser consumidos com moderação e, às vezes, pré-cozidos para reduzir o teor de potássio.
- Diálise: o controle de potássio continua sendo essencial, embora pacientes em diálise possam ter uma maior tolerância, pois o processo ajuda a eliminar o excesso de potássio. Mesmo assim, é importante manter o monitoramento constante.
- Sódio
Tanto no tratamento conservador, quanto na diálise, o sódio deve ser reduzido para controlar a pressão arterial e evitar a retenção de líquidos, que sobrecarrega os rins e o sistema cardiovascular.
Dicas para diminuir o consumo de sódio incluem optar por temperos naturais, cozinhar mais em casa para controlar a quantidade de sal na comida, e reduzir o consumo de alimentos processados e ultraprocessados.
- Fósforo
Pessoas com doença renal crônica precisam evitar o excesso de fósforo porque os rins danificados não conseguem eliminá-lo adequadamente, levando à hiperfosfatemia, que pode causar sérias complicações, como enfraquecimento ósseo (osteodistrofia renal), calcificação vascular e aumento do risco cardiovascular. Além disso, o desequilíbrio entre cálcio e fósforo estimula o hiperparatireoidismo secundário, piorando os sintomas e a qualidade de vida. O manejo inclui restrição dietética, uso de quelantes de fósforo e monitoramento regular, sempre com acompanhamento profissional.
- Tratamento conservador: na alimentação para a doença renal crônica, é importante evitar alimentos ricos em fósforo, como queijos, miúdos (moela, fígado, coração, sarapatel, dobradinha, chouriço, etc), embutidos (salsicha, mortadela, linguiça, salame, presunto, etc), castanhas (amendoim, castanhas de caju e do Pará, nozes), chocolates, bebidas de cola, cervejas; frutos do mar, peixes (sardinha, atum, bacalhau e salmão), gema de ovo, alimentos ultraprocessados e refrigerantes (ricos em fósforo inorgânico).
- Diálise: Pacientes em diálise também precisam limitar o fósforo, apesar da perda parcial durante o tratamento. A suplementação com ligantes de fósforo pode ser indicada para ajudar a controlar os níveis.
- Cálcio
Tratamento Conservador e diálise: o equilíbrio de cálcio é delicado em pacientes com DRC, pois os rins desempenham um papel importante na regulação desse mineral. Em muitos casos, suplementos de cálcio são necessários, especialmente para prevenir a desmineralização óssea.
- Oxalato
O consumo de oxalatos, presentes em alimentos como espinafre, deve ser monitorado para evitar a formação de cálculos renais, comuns em pacientes com DRC. Veja os posts abaixo para saber mais:
- O que comer e o que evitar para prevenir cálculos renais
- Alimentos ricos em oxalato e como reduzir sua concentração
- Citrato
O citrato é importante na DRC por ajudar a prevenir cálculos renais, regulando a formação de cristais de cálcio na urina, e por corrigir a acidose metabólica, comum em pacientes renais, ao melhorar o equilíbrio ácido-base e proteger ossos e músculos. Vegetais ricos em citrato incluem limão, laranja, toranja, tomate e kiwi. Dentre esses, o tomate é uma opção relativamente pobre em potássio em comparação com os outros, especialmente se consumido em pequenas porções ou como molho sem sal. O uso de citrato, entretanto, deve ser monitorado para evitar complicações como hipercalemia (excesso de potássio no sangue).
- Creatina
Em geral, o uso de creatina para pacientes com DRC é desaconselhado:
- Tratamento conservador: o uso de creatina pode aumentar os níveis de creatinina no sangue, gerando confusão nos exames e dificultando a avaliação precisa da função renal. Além disso, embora a creatina não seja comprovadamente nefrotóxica, em pessoas com função renal já comprometida, qualquer carga metabólica extra que dependa da excreção renal (como creatina e seus subprodutos) pode teoricamente sobrecarregar os rins, agravando a condição.
- Diálise: o uso de creatina pode ser mais seguro, uma vez que a diálise remove os subprodutos da creatina, como a creatinina, do sangue. No entanto, deve ser feito com supervisão médica, principalmente em pacientes com sarcopenia, e somente quando houver necessidade específica de preservação muscular, já que a suplementação não é indicada de forma rotineira para pessoas com DRC.
- Cafeína
A ingestão de cafeína deve ser restrita, principalmente para pacientes que têm dificuldade em eliminar líquidos. Café, chás e refrigerantes com cafeína podem afetar o equilíbrio de potássio e outros eletrólitos. Além disso, a cafeína pode elevar temporariamente a pressão arterial, o que também pode ser problemático em pacientes renais, pois a pressão alta é um fator que acelera a progressão da DRC.
- Demais vitaminas e minerais
Além dos micronutrientes-alvo, as demais vitaminas e minerais devem ser repostos conforme as necessidades individuais. O monitoramento constante dessa condição, junto a um médico e um nutricionista, é essencial para ajustar a dieta e, se necessário, incluir suplementos de acordo com as particularidades de cada paciente. Esse acompanhamento contribui para prevenir deficiências, evitar sobrecarga renal e garantir que o paciente receba todos os nutrientes necessários para a manutenção da saúde geral.
Livia Freitas (CRN/SP 3 82983) e Fernanda Furmankiewicz (CRN/SP 6042) – Nutrição e Curadoria da Boomi.