Afinal, o álcool ajuda ou atrapalha o sono?
A relação entre o consumo de álcool e a qualidade do sono é complexa. Para muitos, uma taça de vinho ou um copo de cerveja à noite pode parecer a solução perfeita para um sono tranquilo. Mas, na verdade, o álcool pode atrapalhar significativamente a qualidade do sono.
O álcool ajuda ou atrapalha o sono?
O álcool é um depressor do sistema nervoso central, ou seja, ele pode induzir uma sensação de relaxamento e sonolência. Quando consumido em quantidades moderadas a altas, o álcool pode acelerar o início do sono, diminuindo o tempo necessário para adormecer. Esse efeito leva muitas pessoas a acreditarem que o álcool é um bom auxiliar do sono.
Mas se a sua dúvida é se o álcool ajuda ou atrapalha o sono, saiba que essa indução rápida ao sono vem com um preço. Embora o álcool possa ajudar a adormecer mais rapidamente, ele altera a dinâmica do sono de forma significativa, o que leva a uma piora na qualidade de sono.
O sono é composto por vários estágios, incluindo o sono REM (movimento rápido dos olhos) e o sono não-REM, que é subdividido em quatro estágios:
- Estágio 1: transição entre estar acordado e dormindo.
- Estágio 2: sono mais leve. A temperatura e o ritmo cardíaco e respiratório diminuem.
- Estágio 3: começo do sono profundo.
- Estágio 4: sono profundo. Há a liberação de hormônios ligados ao crescimento e recuperação de células e órgãos.
Cada um desses estágios tem a sua função na restauração e no descanso do corpo e da mente. O álcool interfere nesses estágios de várias formas, como:
- Diminuição do sono REM: os estudos mostram que o consumo de álcool antes de dormir reduz a quantidade de sono REM durante a primeira metade da noite. O sono REM é essencial para a consolidação da memória, a regulação do humor e a manutenção da função cognitiva. A redução do sono REM pode levar a problemas de memória e dificuldades de concentração.
- Fragmentação do sono: à medida que o álcool é metabolizado durante a noite, ele pode causar despertares frequentes, resultando em um sono fragmentado. A fragmentação do sono pode impedir a progressão natural pelos estágios do sono, deixando a pessoa se sentindo cansada e menos restaurada pela manhã.
- Diminuição do sono profundo: O álcool também pode diminuir a quantidade de sono profundo (estágios 3 e 4 do sono não-REM), que é crítico para a recuperação física e a restauração do sistema imunológico. A redução do sono profundo pode resultar em sensação de cansaço e fraqueza física no dia seguinte.
O consumo crônico de álcool pode levar a problemas de sono a longo prazo. Pessoas que bebem regularmente, especialmente em grandes quantidades, podem desenvolver uma tolerância ao álcool, ou seja, precisam consumir mais para sentir o mesmo efeito sedativo. Isso pode levar a um ciclo vicioso de dependência e distúrbios do sono.
Além disso, o consumo crônico de álcool está associado a vários distúrbios do sono, incluindo:
- Insônia: embora o álcool possa inicialmente ajudar a adormecer, ele pode levar a dificuldades crônicas para manter o sono, resultando em insônia.
- Apneia do sono: o álcool relaxa os músculos da garganta, o que pode agravar ou desencadear apneia do sono em pessoas suscetíveis. A apneia do sono é caracterizada por pausas na respiração durante o sono, levando a despertares frequentes e sono de má qualidade.
- Síndrome das pernas inquietas: o álcool pode exacerbar os sintomas da síndrome das pernas inquietas, um distúrbio que causa desconforto nas pernas e um desejo irresistível de movê-las, perturbando o sono.
Diversos estudos corroboram a interferência negativa do álcool na qualidade do sono. Um estudo publicado no Journal of Clinical Sleep Medicine concluiu que o consumo de álcool antes de dormir está associado a uma maior fragmentação do sono e a uma redução significativa do sono REM. Outro estudo publicado no Alcoholism: Clinical & Experimental Research encontrou que o álcool reduz a quantidade de sono profundo e aumenta o número de despertares durante a noite.
Embora possa parecer que o álcool ajuda a adormecer, a qualidade do sono é comprometida, resultando em cansaço e falta de restauração.
Estratégias para melhorar a qualidade do sono sem bebidas alcoólicas
Para quem luta com problemas de sono e recorre ao álcool como um auxiliar, existem várias estratégias eficazes e saudáveis para melhorar a qualidade do sono:
- Higiene do sono: manter uma rotina regular de sono, criar um ambiente propício ao sono (escuro, silencioso e fresco), tomar um banho quente e evitar a exposição a telas antes de dormir pode melhorar significativamente a qualidade do sono. Veja mais detalhes no post “7 dicas sobre como dormir mais rápido“.
- Prática regular de exercícios físicos: a atividade física regular pode promover um sono mais profundo e restaurador. No entanto, é importante evitar exercícios intensos próximo da hora de dormir, se possível.
- Técnicas de relaxamento: meditação e respiração profunda podem ajudar a reduzir o estresse e a ansiedade, promovendo um sono mais tranquilo.
- Alimentação saudável e equilibrada: a relação entre sono e alimentação é complexa e multifacetada. O sono adequado é essencial na regulação do metabolismo, do apetite e do controle de peso. Da mesma forma, a alimentação pode afetar a qualidade do sono e os padrões de sono. Evitar refeições pesadas e muito próximas da hora de dormir, e diminuir a quantidade de cafeína durante o dia, limitando o consumo após às 15 horas, pode ajudar a melhorar a qualidade do sono.
Livia Freitas (CRN/SP 3 82983) e Fernanda Furmankiewicz (CRN/SP 6042) – Nutrição e Curadoria da Boomi.
Referências
EHLERS, C. L.; WIRTZ, S.; EHRENPREIS, L.; PHILLIPS, E. Alcohol-induced Sleepiness and Memory Impairment in Nonalcoholic Humans: Cognitive and Electrophysiological Evidence. Journal of Clinical Sleep Medicine, v. 9, n. 9, p. 907-915, 2013. Disponível em: https://jcsm.aasm.org/doi/full/10.5664/jcsm.3072.
ROEHRS, T.; PAPINEAU, K.; ROEHRS, M.; DRINKWATER, D.; ROTH, T. Ethanol as a Hypnotic in Insomniacs: Self Administration and Effects on Sleep and Mood. Alcoholism: Clinical & Experimental Research, v. 25, n. 9, p. 1286-1292, 2001. Disponível em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1111/j.1530-0277.2001.tb02352.x.